segunda-feira, 26 de abril de 2010

Amanhã, talvez

E agora é hora de esconder dos meus olhos qualquer “bom dia” teu que me deixe assim, desnorteada, coração confuso e dúvidas que não me calam o sono. Decidi que é um tempo só meu. Me tranquei nesse casulo solitário que me abraça, me devora, e que aos poucos, nesse caos de pensamentos, me conforta. Deixei que você escondesse teus pés debaixo da areia que pregou teus passos já não mais vistos no caminho que estou a percorrer. Guardei também os botões daquela sua camisa desbotada. Aqueles despregados, que encontrei na manhã seguinte por entre os lençóis da cama. Prometo um dia devolve-los.
E me deixe calada. Não interfira o meu silencio, às vezes um tanto obscuro, eu sei, mas um silencio que ajuda a curar os hematomas que costumo colecionar. Por mais que eu esteja encolhida, quietinha, me apertando contra a parede, morrendo de medo de olhar para os lados e não te enxergar, sei que preciso sentir essa solidão ordinária que tanto me aflige. Você sabe que eu detesto mostrar essas minhas fraquezas. Que eu quero mesmo é tentar parecer uma mulher forte e decidida, mas tolos são aqueles que acreditam mesmo nisso. Não é por simples enganação. Não. É pelo desespero da proteção. Meu escudo imbatível que teima em não deixar a mostra as minhas outras máscaras expressadas pelo fracasso.
Vou deixar um guarda-chuva pendurado no lado de dentro da porta. Pode levar porque vai chover e eu não quero que pegue um resfriado. Passei e dobrei algumas roupas que você deixou aqui em casa junto com a sua escova de dente cor-de-rosa que eu escolhi para você naquele sábado a tarde no supermercado, lembra? Pode levar tudo. Isso seria um favor que você me faria. É para que eu não perca muito tempo com lágrimas baratas e frases de auto-consolo enquanto acarinho objetos que te pertencem, já que você não me pertence mais.
Tranque a porta e esconda as chaves dentro do vaso de lírios que você me deu de presente. Aproveite para perceber que elas ainda continuam lindas mesmo depois de você insistir tanto em regá-las excessivamente. Admire-as e se despeça. Elas sentirão a sua falta tanto quanto eu.
E assim você poderá partir. Eu estarei aqui se um dia quiser me fazer alguma visita. Tomaremos uma xícara de café ou compartilharemos um vinho agradável. Quem sabe eu ainda guarde as velhas fotos e cartas, e poderemos relembrar os antigos episódios de nossa história meio sem pé nem cabeça. E faremos cócegas onde hoje as feridas machucam. Um passado esboçado por um amanhã mais feliz.

E te levarei sempre comigo, no abstrato, no consciente interior, mesmo que eu não saiba direito onde ir, que direção seguir.

Me leva também, se você quiser.

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