quinta-feira, 8 de julho de 2010

Além

Um dia cheio de mim, na minha mais interna felicidade. O auge de toda delícia em degustar-se da própria existência. Pode parecer narcisismo absurdo ou egoísmo extremo, mas não resumo de forma tão superficial. É muito além de pejorativos formais. É minha inquietude introspectiva que dilacera minha sensibilidade mais aguçada em perceber os detalhes minimalistas camuflados no meio do que é obviamente sensato se notar. Trepadeiras floridas, telefones públicos enferrujados, ou as cores vibrantes do jardim de rosas da senhora que as rega tão cuidadosamente todas as manhãs. Palavras doces que surpreendem, telefonemas especiais e inesperados. E assim foi o decorrer desse dia tão extasiante, uma constante harmonia positiva.

E por mais que existam ciscos de coisas que às vezes incomodam e tentam destruir toda essa calmaria, tento me desprender do desnecessário. E sorrio porque percebo que posso ir mais alem do que acoberta a casca, a superfície seca e áspera. Uma sabedoria que só é encontrada dentro de si. E só compreende quem tem a coragem necessária de saborear o desconhecido, de mergulhar-se.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

É íntimo e necessário

As pessoas se queixam dessa quietude das minhas palavras. Sentem falta das frases que não se completam, e às vezes não existe tanta coerência naquilo que falo, já que engolir pensamentos pode ser mais simples. Nem tudo precisa ser entendido, dito. Basta que eu compreenda sozinha. E me identifico comigo, mais do que qualquer um, quando se trata de me aconchegar na minha bolha silenciosa, olhando fixamente pra um espelho que retrata os meus olhos no formato real, exteriorizados. Essa análise de dados pessoais íntimos é tão constante que se é notado facilmente. E quem nota, não percebe o valor e não aprova. Não que eu precise da aprovação alheia. Não tenho interesse de aceitação, apenas gostaria que não julgassem de maneira equivocada, com um pré-conceito estabelecido pela arrogância.
Cada um tem seu jeito de se esquivar da insegurança. É natural, instintivo, assim como o tatu-bola se enrola nele mesmo quando sente medo. Sensível e minúsculo demais pra morar nesse mundo cheio de pés andantes enormes que saem pisando por aí. Essa insegurança engole as pessoas, por mais estáveis que sejam, ou porque de tão orgulhosas, não aceitam as próprias falhas.
Ah, quanta bobagem! Não deixo de concordar. É que algumas vezes paro pra pensar nessa loucura que vivo e que as pessoas ao redor vivem, ou fingem viver. Tão mergulhadas nessa poeira solúvel que afoga a identidade delas. Onde fica a essência? Escondida por trás dos olhos pregados no espelho.
Então afirmo, na minha curta experiência de duas décadas vividas: É preciso, sim, uma dose de solidão interior, algo que faça reacender o encanto apenas refletido.

sábado, 3 de julho de 2010

À Petit-four

Foi um instante de distração, talvez um mero acaso, ou o destino com suas artimanhas infalíveis. Bom, não importa como, apenas que há dois anos nossos caminhos se cruzaram em uma tarde qualquer (de primavera, suspeito) em um desses corredores que fazem a gente cruzar olhares com pessoas estranhas casualmente. E lá estava você com seus cachos interessantes, aquela cor do pecado, aquele sorriso de peixe-palhaço-simpático distribuindo panfletos artísticos. Obviamente não pude deixar de notar aquela beleza fora do padrão, exótica, inconfundível aos olhos de quem se encanta tão facilmente. Minhas tentativas de manter algum contato direto, com intenções mais ousadas, não tiveram muito sucesso na época. Mas tudo bem, o tempo é um bom companheiro. Você se tornaria minha paixão platônica adormecida naquele desejo súbito de conhecer um beijo seu. E então as estações mudariam, os ventos seguiriam outra direção, pessoas passariam por minha vida e me levariam até você outra vez.

Você surgiu tão natural quanto o seu abraço que me aquece no frio da madrugada, perambulando sozinhas pelas ruas. E quando te vejo, no final de todos os dias cansativos, minhas energias se renovam com a sua presença. É você quem está ali pra escutar todas as reclamações, inclusive o estresse na calamidade do trânsito. E eu gosto de você do jeito que você é. Gosto quando toca violão e canta baixinho, só pra mim. E sua voz é tão gostosa que as vezes eu adormeço ouvindo você cantar Marisa Monte. Gosto até quando teima comigo até ganhar a causa e se empanturrar de cachorro quente da esquina coberto de ketchup. Também não ligo taaaanto (perceba a ênfase) pras suas crises de insanidade pisciana (vulgo “ciúmes”) por que depois de cada discussão vêm a vontade imediata de fazer as pazes. Você é linda com uma flor no cabelo, no meio da praça, deitada na toalha estendida, olhando as árvores com suas folhas secas de outono. É mais linda ainda quando meus olhos te fotografam de longe, enquanto você aprecia o céu coberto de estrelas, no meio de um gramado imenso que tem no caminho pra casa. E voltamos de mãos dadas com você me ensinando a cantar pelo diafragma. Adoro quando me surpreende, como quando me deu um cd novinho da Edith Piaf, enquanto eu te dei um pote de Pringles (falsificado, diga-se de passagem). Ou quando me pediu em namoro, no meio de uma rua deserta, de madrugada, ouvindo o farfalhar das folhas de árvores desassossegadas com o vento. Admiro o seu jeito meio moleca inconseqüente, meio mulher madura e responsável. Admiro o seu coração, seu jeito doce, que foi me conquistando aos poucos, junto com o truque de me dar flores quase todos os dias. Fica aí a dica de conquista (risos).

E assim a gente segue esse romance ganho pelo tempo, não o tempo de espera, mas o tempo certo, pras coisas acontecerem no momento exato. Cada uma com seus defeitos e qualidades indispensáveis, suas dores e cicatrizes e a reciprocidade de sentimento. A gente se cura, se entende e se completa.

Petit-four, meus dias são mais felizes com você do meu lado.


“Onde a brasa mora e devora o breu

Como a chuva molha o que se escondeu.
O seu olhar, seu olhar melhora, melhora o meu.”