sábado, 26 de dezembro de 2009


e é quando se encontra uma palavra certa, um sorriso esperto, daqueles que enfeitam o rosto
que tudo fica mais doce e delicioso
e é como quando a gente bota os pés descalços na grama verde, na terra fofa, molhando os cabelos com chuva fresca
aí vem aquela sensação de liberdade que a gente alcança num instante único
e é quando se observa o céu no final da tarde e quase confundimos com uma obra de arte de algum artista famoso
as cores de um infinito em algodão doce.
e é tão bonito olhar o nada e admirar essa imensidão de matéria abstrata...
é quando a gente encontra pétalas nas mãos da moça que a gente ama. suave toque da pele macia que me acarinha
me acorda com voz de sono. me faz fechar os olhos pra enxergar de dentro o que eu não consigo ver daqui.
é tão bonita essa beleza pura que a gente sente
vai tomando conta aos poucos
alimentando a alma com fome de vida




Essa nuvem de poeira me sufoca


Que seja breve esse tormento.

sábado, 21 de novembro de 2009

as vezes tenho vontade de explodir em palavras
mas é tudo bobagem,
tudo bobagem...

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Fugi com a primavera. Roubei todas as flores pra enfeitar a minha bolha.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Escreve cem vezes a mesma palavra na parede. Escreve, escreve, escreve pra que? Pra quem? Pra mim? Não sei, José. Desenha, pinta e rabisca. Escreve nas linhas brancas da tinta. Observo. É bonito. É bonita a escrita. Sem coerência nenhuma. A mesma palavra, só. Um nome? Uma coisa? Um desejo recolhido. Com giz de cera, caneta invisível, preenche centímetros retilíneos. Escreve cem vezes a mesma palavra. Poesia até nas tranças do cabelo comprido. Debruça-se no chão, faz contornos com os dedos. Desenha um sorriso nos lábios e cola na parede. Escreve cem vezes, incansavelmente.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Sonia

Pobre Sonia, já estava empoeirada. Há tanto tempo que não a retiro do meu emaranhado de loucuras. Aqueles fios de neurônios soltos e enrolados a esconderam de mim. Foi esquecida, coitada. – Sonia, como andas, menina? Venha me dar um abraço e perdoe-me por ser tão desnaturada. Sabe como é... o tempo vai passando e a gente vai ocupando a cabeça com outras coisas. – Agora volto a vê-la, bela e pomposa! Que graça de menina. Menina-mulher, pois eu a amadureço demais de vez em quando. A partir de agora, darei a ti ares mais juvenis e graciosos. A não ser que tu queiras voltar a ser a mulher do vestido longo, com as unhas pintadas de esmalte rubí.

- Sonia, Sonia, Sonia. Ainda não havia encontrado denominação melhor. Pois devia ter pensado nisso muito antes. Imagine, não há nome melhor que lhe sirva...

Senti sua falta. Procurei me encontrar em outros universos, mas nenhum me identifica tanto quanto o teu. O teu que é meu, tu sabes bem. Pois cá estou novamente, e quero voltar a dividir minhas angústias que te dão vida. Transfiro pra tua existência toda a confusão acerca de minha mente. Isso me conforta e sei que te agrada muito. Encontro em você a companhia que sempre busquei nos dias nublados, ou aqueles em que o sol faz até arder os olhos com tanta claridade. O teu afago invisível se faz presente quando próxima de mim. É tão bom. É tão bom tê-la outra vez. As pessoas vão embora o tempo todo. Os outros. Você fica, Sonia. Você sempre permanece em mim. E essa mágica de fazer perdurar o nosso encontro, que obviamente será eterno, me faz crer que ainda existe uma parte minha estável. Pois eu sou você, aqui ou lá, ontem ou hoje. E tu, Sonia, sou eu em outras faces, em várias poses. É a personagem dos meus espetáculos.

sábado, 17 de outubro de 2009

'A uma hora dessas por onde estará seu pensamento? Terá os pés na pedra ou vento no cabelo? A uma hora dessas por onde andará seu pensamento? Dará voltas na Terra ou no estacionamento? Onde longe Londres Lisboa ou na minha cama? A uma hora dessas por onde vagará seu pensamento? Terá os pés na areia em pleno apartamento? A uma hora dessas por onde passará seu pensamento? Por dentro da minha saia ou pelo firmamento? Onde longe Leme Luanda ou na minha cama?'

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

agasalha-me o sangue
pois ele corre frio em minhas veias.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Eu fico aqui com meus discos dos beatles e um riso perdido no teto do quarto, lendo cartas antigas de amores improváveis, canções com cheiro de passado. Um perfume desbotado que já não impregna mais. Flores secas dentro de um livro, ou um diário antigo que guarda dias antigos. O preto e o branco reconstituindo cenas como em um daqueles filmes que eu gostava de assistir. Um céu azul e as nuvens com seus formatos faziam parte de um quadro. Meu lindo cenário em dias de sol. Mas ouço alguém dizer dentro de mim: - Old times, meu amigo. Já passou...

Pois não vivo se é pra esquecer

vivo pra existir naquilo que já fui.

sábado, 5 de setembro de 2009

Não busco explicações lógicas ou sensatas para descobrir os motivos pelos quais meus olhos se encantaram pelos teus. Apenas sinto e me permito sentir. Desenho cenas e cenários em nossos capítulos imaginários. Poemas escritos em folhas de caderno, taças de vinho que me embriagam de você. Teu corpo colado no meu. Materializo tua voz a me chamar pelo nome. Mãos que se encontram, se conhecem e se casam. A essência do perfume, o perfume e a essência tua, que se confundem em mim. Me entorpece de você. Você, você... Delírio do meu universo abstrato, pintado com as tuas cores. E aqui escrevo, suplicando aos céus, ao tempo, ou qualquer responsável por unir destinos... que amanhã não demore pra chegar. Meu futuro próximo é estar em seus braços.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Perco o controle dos pensamentos que invadem a mente, que me toma por completo e que me faz delirar em minha própria loucura. Ilusão é a que mata minha sede, saciando com idéias pretensiosas que fazem desejar intensamente o que preciso. Imaginação já mecanicamente ativada a dirigir-se àquela direção. É real quando se é abstrato. Nessa bolha que eu criei, formulo as minhas leis.
Meu corpo responde aos comandos criados pelos meus sentidos. Ver, ouvir, falar. Mas ainda falta. É preciso tocar. É preciso sentir com a pele, degustar através das mãos. Escutar através dos poros da textura sólida, a linguagem do seu corpo de mulher. A delicada silhueta feminina que instiga o instinto carnal, misturando-se ao sentimento que oxigena a alma, fazendo ressurgir das cinzas a inocência de um sentir puro e sensível a tudo o que se faz sórdido. Os fios de cabelo longos e macios que dançam com o vento suplicam a carícia dos meus dedos. Perfume de moça é a essência da beleza das flores que vem com a brisa fresca. O cheiro me faz pairar nas nuvens mais altas do céu.
Trago pra mim em sonhos profundos e lúcidos, o sabor de beijos ardentes e cheios de amor. É lá que me encontro. Lá onde você existe. É a minha realidade, a bolha, a minha lei.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Eu vou sentar aqui e escutar aquele velho blues.
Depois vou pegar a minha mala e os meus cigarros velhos e voltar pra estrada que antes me levou.
Vou olhar a lua cheia e pedir que ela guie minhas pernas pra qualquer lugar seguro
E que me faça adormecer contando histórias de terror.
Vou deixar o vento sussurrar nos meus ouvidos os segredos que a noite esconde
E quando amanhecer com o sol sorrindo, a minha gaita me fará a companhia que preciso.
A solidão será o que me fará entender os motivos pelo qual parti. E a liberdade será o que irá me permitir seguir.
Então deixo pra trás o tempo, o medo e as correntes da minha prisão.
E vou embora pra não voltar.
Vou embora pra algum lugar que seja meu.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Medo

Medo que me sentencia,
Que me esconde atrás das pernas da tia
Com medo da mulher estranha.
Medo que me refugia,
Que me esconde debaixo dos cobertores
Com medo de olhar debaixo da cama.
Medo que me cala os lábios,
Que me esconde na multidão
Com medo de falar alto.
Medo do público, do mundo, dos outros.
Encolho-me embaixo da mesa
Encolho-me e ela me acolhe.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Teu sorriso eu gravei na parede
deixei pendurado
e toda vez que eu paro pra olhar
me vem a saudade pra sufocar.
Distância que vai e vem
que tras as malas e volta sem
- vem pra ficar, meu bem.
Mas teu sorriso gravado na parede
me satisfaz mesmo carente do teu abraço.
e quando perto do meu beijo você sorri
eu entendo que a saudade que eu senti
era a vontade de ter gravado teu sorriso,
não na parede,
mas em mim.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Já não escrevo mais como há um tempo atrás
Quando as minhas mãos desenhavam sobre o papel
E debaixo da fruteira eu derretia meus versos.
Perdi a forma certa de pintar cenários,
Esboçar palavras no rascunho em branco
Perdi a fórmula de calcular frases coerentes,
De conjugar os verbos na pessoa certa.
Já não existe mais a mente esclarecida.

Já não encontro mais a inspiração sensata.






"O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos severos conosco,
pois o resto não nos pertence. "
Cecília Meireles

sábado, 18 de abril de 2009

Sou minha

Como um sabor de delírio que fulmina com gosto de fel. Onde a incúria dispensa compaixão, penetra tão fundo, machuca. Arde na boca e amarga o final. Final sem começo. Início sem rumo. Como um ar rarefeito que penetra o vácuo, afoga o silêncio, refaz o errado, encobre o pecado, apaga o passado. Êxtase incondicional, extremo, explícito. Harmonia e loucura que se confudem, se completam. Mórbido e estimulante, que contradiz, mas que condiz. Exageradamente inofensiva, insípida , irreversível. É lírio, é lís, é jasmim com espinhos. O ébano de luxo ou o pirata extorquido. Um pierrot de pijamas com lágrimas de tinta barata. O rascunho do molde sem conserto, emendas sem costura. É a imaginação indecente, instigante, reprimida. É aqui, ora é lá. Irritantemente inconstante. Ilusão inocente, frenética e abstênica. Discreta e vulnerável. Fria. É brasa, é fogo. Calor. Sem reflexo, sem sombra, sem outra semelhante. Sou eu, sou só, sou minha.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

[...]

Bate na janela, me diz que é a hora certa de fugir daqui. Me pega pelos braços, arranca os meus pecados e me ensina a ser feliz. Eu me desfaço em verbos que eu criei pra ti. Eu sufoco nesse abismo que nasceu em mim. Afogo em devaneios. Loucura que entorpece o que eu senti.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Cenário

Um cenário de vidro, caído. A peça não terminou. Palhaços na platéia. O público no palco. Saudações.
A protagonista fugiu. Voou, voou...
Sem pés no chão, sapatos na mão. Olhou pro céu, e então caiu, estatelou.

Um cenário de vidro. A protagonista quebrou. Acabou, acabou...

sexta-feira, 13 de março de 2009

Fotografia

Hoje o mar faz onda feito criança, no balanço calmo a gente descansa.Nessas horas dorme longe a lembrança de ser feliz. Quando a tarde toma a gente nos braços, sopra um vento que dissolve o cansaço. É o avesso do esforço que eu faço pra ser feliz. O que vai ficar na fotografia são os laços invisíveis que havia. As cores, figuras, motivos. O sol passando sobre os amigos. Histórias, bebidas, sorrisos. E afeto em frente ao mar. Quando as sombras vão ficando compridas enchendo a casa de silêncio e preguiça, nessas horas é que Deus deixa pistas pra eu ser feliz. E quando o dia não passar de um retrato, colorindo de saudade o meu quarto, só aí vou ter certeza de fato que eu fui feliz.O que vai ficar na fotografia são os laços invisíveis que havia. As cores, figuras, motivos. O sol passando sobre os amigos. Histórias, bebidas, sorrisos. E afeto em frente ao mar.

Leoni

terça-feira, 10 de março de 2009

Lençois de seda

Ela engole o ar seco. Tem gosto de fel, corta, arranha. As mãos envergonhadas abraçam o dinheiro sujo. Trabalho feito. Prazer financiado em notas de papel. Qual seria o preço que Deus pagaria pelo corpo que fora inspirado em Sua imagem e semelhança? O diabo trocá-lo-ia pela alma.
A cama vazia, o olhar dela no espelho quebrado. Contorce-se entre os lençóis, grita, entorpecida com a ferida que se abriga em seu ventre. A dor fere-lhe. São como estacas que invadem os poros de sua pele. São como espinhos que espetam a carne macia.

Aonde chegara, afinal? Já não havia mais portas onde pudesse escolher uma saída sem escorregar pelos degraus da escada que conseguiu subir. Tentou mudar, salvar-se, mas a vida talvez não lhe tivesse sido tão generosa.
Por trás dos olhos de mel, havia ainda os olhos amargos.

Correu para a sacada do prédio, vestida de lençóis de seda e lágrimas de sangue. Despiu-se e deitou-se no chão frio de mármore. Purificava o corpo sob a luz de uma lua cheia, cheia de piedade. O ar gélido reprimia seu corpo contra ele mesmo. Corpo bordado de flores. Seios que seduziam o céu. Lábios que cantavam silêncio. Musa de uma noite morta. Os braços e pernas lhe pareciam não fazer mais parte do conjunto de suas curvas. Derretia-se no veneno de seu pecado.

domingo, 8 de março de 2009

ao dia das mulheres

A pérola que encontrei no blog de Thiago Chiapetti, jornalista do Jornal de Beltrão:

"02 de março de 2009

O dia delas

No próximo dia 8, o mundo homenageia as mulheres. Não sei exatamente a origem desta comemoração, mas compreendo que se trata de uma data muito bonita. Muitas delas recebem flores, poesias e presentes.

E não apenas neste dia, as mulheres são rotineiramente surpreendidas. É no aniversário de nascimento, de namoro, de casamento, no Dia das Mães, num dia qualquer com uma demonstração de amor do pai, do irmão, do namorado, do marido ou do amante. É sempre bom preparar aquela surpresa.

Elas amam. Ainda mais se for com flores ou bombons.

Tem gente que faz aquela piada de que todos os outros dias do ano são dos homens. Eu não concordo. Entendo que todo dia é dia de homenagear, seja homem ou mulher. No entanto, neste momento em que a humanidade comemora um movimento feminista, vale destacar um comparativo que constatei esta semana.

No sábado, as mulheres se reuniram no Santa Fé, num chá promovido pelo Apoio Feminino da Adhonep. Tudo muito bonito, tudo muito delicado. Pude perceber que elas realmente conquistam o mercado de trabalho. Mas confesso que serei eternamente admirador daquelas corajosas que renunciaram a profissão para dedicar-se ao ofício de cuidar dos filhos e do marido e administrar a casa.

Este é, inclusive, o tema do suplemento especial do Dia da Mulher do Jornal de Beltrão deste ano. Enquanto ainda produzimos as reportagens, constato lindas histórias de mulheres que se destacam, sem deixar o seu lar. Onde quer que elas estejam, estão sempre colorindo os nossos olhos."


Agora, a minha resposta ao tal jornalista:

"Resposta ao jornalista Thiago Chiapetti do Jornal de Beltrão.

Não precisamos de flores, bombons, presentes, poesias, enfim, agrados materiais que o jornalista Thiago Chiapetti acredita que nós, mulheres, amamos receber, se não temos o reconhecimento da nossa importância na sociedade. O nosso caro jornalista relata em seu discurso, “Não sei exatamente a origem desta comemoração, mas compreendo que se trata de uma data muito bonita.”. A partir daí o artigo perdeu totalmente o sentido. Acredito que a função de um jornalista é buscar informações sobre aquilo o que ele deseja escrever publicamente. Até mesmo meu irmão de seis anos de idade já aprendeu sobre a origem da comemoração do dia das mulheres (deixo claro minha ironia).
Quanto ao tema do suplemento especial do Dia da Mulher do Jornal de Beltrão que homenageia as mulheres donas-de-casa, “mulheres que se destacam, sem deixar o seu lar”, segundo Chiapetti, quero dizer que também as admiro. No entanto, a razão de se comemorar essa data está refletida na luta que as mulheres sempre enfrentaram em sobressair-se no mercado de trabalho, buscando por direitos iguais, por melhores salários, pelo fim da violência e o preconceito masculino, ou seja, a desvalorização da mulher na sociedade. Essa luta não é de hoje, como relata o autor ao dizer, “neste momento em que a humanidade comemora um movimento feminista”. Engana-se, pois há décadas que o movimento feminista vem ocorrendo [informe-se melhor, caro informante].
Quanto ao “comemorar”, o que exatamente deveríamos comemorar? Os baixos salários comparados aos dos homens? A violência que as mesmas sofrem por seus pais, namorados, companheiros? A ingratidão dos próprios filhos? A “mercantilização” do corpo como produto de venda publicitária? Sim, já alcançamos muitas conquistas e direitos. Eles estão contidos em algum lugar da legislação brasileira, mas será que na prática também?
Nós, mulheres, ainda temos muita camisa para suar, muitos leões para matar, muitas batalhas para vencer. E repito, não são flores, bombons, presentes e poesias que vão nos satisfazer, mas sim, o respeito e a consideração de uma sociedade machista.

Stephanie Natalie Burille, 19 anos, estudante de Enfermagem da Universidade Estadual do Oeste do Paraná."

sábado, 7 de março de 2009

“Perto do coração selvagem”, Clarice Lispector .

“Sinceramente, eu vivo. Quem sou? Bem, isso já é demais. Lembro-me de um estudo cromático de Bach e perco a inteligência. Ele é frio e puro como o gelo, no entanto pode-se dormir sobre ele. Perco a consciência, mas não importa, encontro maior serenidade na alucinação. É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer, porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto transforma lentamente no que eu digo. Sinto quem sou e a impressão está alojada na parte alta do cérebro, nos lábios – na língua principalmente -, na superfície dos braços e também correndo dentro, bem dentro do meu corpo, mas onde, onde mesmo, eu não sei dizer. O gosto é cinzento, um pouco avermelhado, nos pedaços velhos um pouco azulado, e move-se como gelatina, vagarosamente. Às vezes torna-se agudo e me fere, chocando-se comigo. Muito bem, agora pensar em céu azul, por exemplo. Mas sobretudo donde vem essa certeza de estar vivendo? Não, não passo bem. Pois ninguém se faz essas perguntas e eu... mas é que basta silenciar para só enxergar, abaixo de todas as realidades, e única irredutível, a da existência. ”

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Cartas

Escreveu sem saber pra quem. Não havia destino, não havia ninguém. Tão leve corria o lápis sobre o guardanapo de papel... Palavras suaves, secas, algozes, e um vinho a inspirar. Tudo o que lhe faltava era alguém para amar. E as cartas escritas na mesa do bar foram guardadas na gaveta do armário da sala de estar.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Eu pergunto,

eu questiono o que se passa lá fora da janela. Cortinas de lado, olhar pro alto, meus olhos no céu. As ruas se escondem, não respondem, somem. Eu fico a pensar com o queixo sobre as mãos debruçadas sobre a madeira da janela. O mundo me olha com cara de sono e as nuvens tortas regam o dia. Dia cinza, cansado de existir. Entristeço, fecho tudo, tranco o mundo, vou dormir.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

O anjo mais velho

"[...] metade de mim
agora é assim
de um lado a poesia, o verbo, a saudade
do outro, a luta, a força e a coragem pra chegar no fim
e o fim é belo, incerto...
depende de como você vê
o novo, o credo, a fé que você deposita em você e só

Só enquanto eu respirar
Vou me lembrar de você."

Teatro Mágico

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Perdi a hora...

...que me trouxe aqui.
vamos esquecer de voltar
o caminho é longo,
eu aprendi.
sem desculpas pra não inventar
sem retorno pra recomeçar
o arrepender caiu de moda
não precisou se desculpar
as cores perderam o tom
a música perdeu seu som
sem poemas ou canções do avesso
dia e noite, sinônimos de tempo
o tudo deixou de ser
o nada voltou a estar
e o vento mudou a direção
pra deixar a vida passar.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

?!

Nunca soube o que escolher. As chances foram muitas durante toda uma vida. Tão imprevisível. Tão impulsiva. Nunca se satisfez com nada que não fosse difícil o bastante de lidar. O improvável lhe seduzia. Sempre esteve no controle, talvez por isso as coisas nunca saíssem da forma mais adequada... Talvez fosse culpa do zodíaco, ou de seu gênio, por vezes detestável. Ainda assim preferia ser o que era a ser alguma coisa ainda pior. Julgava que pessoas muito diferentes dela não fossem tão interessantes, ou tão felizes. Por mais que perdesse algumas de suas batalhas, sentia-se plena por tentar vencê-las e por saber que sempre havia um fim, mesmo que ele não fosse o melhor.
Procurava entender pontos de vista alheios. Procurava entender que não era a única a tropeçar. No entanto, nunca entendeu o porque deveria entender tudo isso.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Janeiro. Férias.

Passagens. Malas. Estrada. Espera. Cansaço. Saudades. Abraços. Parentes. Amigos. Fotos. Vídeos. Risos. Bares. Cerveja. Comida. Muita comida. Cinema. Pessoas. Olhares. Sorrisos. Convites. Festas. Ressacas. Tédio. Planos. Papo furado. Conversa séria. Pernas pro alto. Pensamentos vagos. Lembranças. Saudades. Música. Pessoas. Baralho. Sonhos estranhos. Dias felizes. Dias quentes. Chuva. Saudades. Despedidas. Passagens. Malas. Estrada. Cansaço. Abraços. Família. Casa.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Pra rua me levar

Não vou viver como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho onde eu vou
As vezes ando só trocando passos com a solidão
Momentos que são meus, e que não abro mão
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
Eu vou lembrar você
É mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar, e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar


Ana Carolina

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

rima pobre.

percebo que o mundo gira devagar
e o tempo passa rápido demais
não sei se devo parar pra pensar
se devo seguir sem olhar pra trás
se o futuro pertence aos demais
ou só a quem eu penso ser eu
mas o mundo gira devagar
e o tempo não espera você chegar
o hoje era o ontem de amanhã
e quem sabe não se pode mais errar.

uma rima idiota.
saudade de escrever também.

domingo, 25 de janeiro de 2009

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

hoje a estrada é minha

de malas prontas
pronta pra partir
partir pra longe,
pra distrair.
não sei quando volto
só sei que devo ir
pra bem distante,
pra além daqui,
pra além de mim.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Por Markus Zusak

"Tive vontade de dizer muitas coisas à roubadora de livros, sobre a beleza e a brutalidade. Mas que poderia dizer-lhe sobre essas coisas que ela já não soubesse? Tive vontade de lhe explicar que constantemente superestimo e subestimo a raça humana - que raras vezes simplesmente a estimo. Tive vontade de lhe perguntar como uma mesma coisa podia ser tão medonha e tão gloriosa, e ter palavras e histórias tão almadiçoadas e tão brilhantes.
Nenhuma dessas coisas, porém, saiu de minha boca.
Tudo que pude fazer foi virar-me para Liesel Meminger e lhe dizer a única verdade que realmente sei. Eu disse à menina que roubava livros e a digo a você agora.

UMA ÚLTIMA NOTA DE SUA NARRADORA:
Os seres humanos me assombram."

A última página de a menina que roubava livros. A última frase.
Um pouco familiar, não?! hehe.

domingo, 11 de janeiro de 2009

The Blues come over me

O Blues é um estilo musical criado por volta de 1603 pelos escravos africanos atracados no sul dos Estados Unidos. A música era uma forma de compensar a árdua jornada de trabalho que enfrentavam todos os dias nas plantações de algodão. As poesias expressavam o sofrimento, a angústia e a saudade da antiga terra, e eram envolvidas pelo ritmo calmo e suave do violão. Ao longo do tempo, o Blues também sofreu mudanças, modernizou-se, tornou-se cada vez mais conhecido, conquistando músicos e admiradores.
Outros estilos musicais como o ragtime, o jazz, o rhythm and blues, o rock and roll, a música country, além de ska-rocksteady, soul music, a música pop convencional e até a música clássica moderna se originaram ou foram influenciados de alguma forma pelo Blues.

Blues, que na tradução quer dizer melancolia, deixa de ser um estereótipo musical. Blues é a música da alma. É a expressão do estado de espírito. Suas notas e seus versos são capazes de preencher, de fazer sentir cada timbre soar dentro de nós. A sensualidade consegue transpassar as cordas do violão e da guitarra, o sopro da gaita ou do sax.


“The blues come up behind
The blues wait up ahead
The blues ask why you are born
If you just end up dead”
The Blues come over me – B.B. King, um dos maiores gênios do blues americano.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

o que se vê aqui

não é um simples acaso.
deixa ficar subentendido.

Fantasmas não choram

Sentada em frente à penteadeira do quarto, ela passeava a escova delicadamente por entre os compridos fios negros que hoje pareciam mais lisos. A pele branca destacava-se ainda mais dentro do vermelho da camisola de seda. A luz de um abajur próximo ajudava a refletir sua face de aspecto fantasmagórico. Era assim que ela se sentia. Um fantasma. Ao fitar os próprios olhos, parecia perfurar a alma em busca de algum resquício de vida. Por mais que ainda sentisse a textura macia do tapete aos seus pés, ou a brisa fria do vento que invadia o quarto e arrepiava os pêlos do corpo todo, mesmo assim, ela acreditava que seu abismo interior já havia sugado toda e qualquer forma de existência que um dia já esteve lá dentro dela.
A noite trazia o silêncio ensurdecedor. Trazia também as lembranças. O passado exalava o perfume das outras estações. Houve dias de sua vida que mereciam ser guardados dentro de uma caixa colorida com fitas de cetim. Houve momentos que mereciam durar uma eternidade. Agora só restavam lembranças.
Uma lágrima escorreu pelo rosto branco, sem expressão. Desceu lentamente, regando os poros que encontrava na superfície da pele. Tocou o canto dos lábios. Ela enxugou a pequena gota. Tratou de expulsar aquele amontoado de líquido celular. Recompôs-se. Afinal, fantasmas não choram.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

[...]

Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.


Fernando Pessoa

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Presente à flor do limo.

Menina dos olhos de mel
da pele morena e do cabelo macio.
Menina que se esconde longe
lá perto do mar,
debaixo do céu.
Sereia bonita, tão cheia de curvas
mistério e charme pra seduzir
a voz tão doce canta as notas mais suaves
que é pra encantar à quem por perto está.
Menina de luz, única, intensa
se entrega pro mundo, pra vida, e pra ser feliz.
Se cai, levanta.
Se sorri, contagia.
Se abraça, protege.
Menina do coração enorme, que acolhe, que ama.
É ela, Satine, completa por si só.
Beleza que não se compara, não se descreve.
Olhos sinceros de menina,
jeito distinto de mulher.

Flor bela.


Florbela Espanca nasceu em Vila Viçosa, Portugal, em 1894. Tornou-se poetisa e publicou várias obras, tais como Charneca em Flor (1930), Cartas de Florbela Espanca, por Guido Battelli (1930), Juvenília (1930), As Marcas do Destino (1931, contos), Cartas de Florbela Espanca, por Azinhal Botelho e José Emídio Amaro (1949) e Diário do Último Ano Seguido De Um Poema Sem Título, com prefácio de Natália Correia (1981). O livro de contos Dominó Preto ou Dominó Negro, várias vezes anunciado (1931, 1967), seria publicado em 1982.
Como uma de minhas autoras de preferência, Florbela me cativou pela sua feminilidade ao suavizar as palavras e torná-las mais íntimas. Temas como solidão, desespero, sofrimento, traduzidos em ternura, sensibilidade, me fizeram sentir atraída por seus versos.
Uma Don Juan mulher, que canta suas tristezas no papel, que nos faz apaixonar por seu talento.


"Ando a chamar por ti, demente, alucinada,
Aonde estás, amor? Aonde… aonde… aonde?…
O eco ao pé de mim segreda… desgraçada…
E só a voz do eco, irônica, responde!
Estendo os braços meus! Chamo por ti ainda!
O vento, aos meus ouvidos, soluça a murmurar;
Parece a tua voz, a tua voz tão linda
Cantando como um rio banhado de luar!
Eu grito a minha dor, a minha dor intensa!
Esta saudade enorme, esta saudade imensa!
E Só a voz do eco à minha voz responde…
Em gritos, a chorar, soluço o nome teu
E grito ao mar, à terra, ao puro azul do céu:
Aonde estás, amor? Aonde… aonde… aonde?…"

Um Ás de Copas fora do baralho

Olá, senhores e senhoras cartas. Como podem perceber sou um Ás de Copas. Há algum tempo me perdi de meu baralho e agora sigo por aí, em busca de um novo abrigo, e talvez uma resposta. Pois bem, deixem-me contar a minha triste história.
Eu morava longe daqui. Convivia com outras cartas muito simpáticas e morava com uma mulher que cuidava da gente. Ela era uma cigana. É, É... eu sei que toda carta deseja ser posse de uma cigana. Só elas sabem o valor que temos.
Ela era delicada. Podíamos sentir a suavidade de suas mãos ao nos embaralhar. Sentíamos que ela nos sentia. Só ela tinha aquele jeito dela de jogar, de abrir o jogo, de nos distribuir na mesa.
Dentre todas as cartas, eu era aquela que ela mais gostava. Ela me guardava no bolso de seu vestido verde e me levava por aí. Ela só não gostava muito quando me via no meio do jogo da sorte de alguém.
Foi então que um dia ela decidiu ler a própria sorte. Estava sentada na mesma mesa, por entre a penumbra, com o incenso e as velas acesas. Tudo como naturalmente era feito. Ela pegou as cartas e embaralhou todas. Eu estava lá no meio. Foi então que ela começou o jogo. De repente chegou a minha vez. Eu estava entre as cartas escolhidas. Isso assustava. Isso assustava muito.
A cigana levantou. Cambaleou para o lado. Sua respiração era um pouco ofegante. Pude ver a preocupação em seu semblante. Logo notei que eu era a carta inesperada que predizia má sorte.
Depois disso percebi que o comportamento da cigana em relação a mim, mudou. Eu já não era mais a carta preferida. Já não era carregada no bolso. Às vezes ela me trancava em uma gaveta, longe das outras.
Então, certo dia ela decidiu que eu já não faria mais parte daquele monte de baralho. Eu partiria para muito longe dela, para que não mais trouxesse o azar no jogo de sua vida.

Pois é, meus amigos. Agora estou aqui, de passagem apenas. Continuarei a seguir o meu destino. Quem sabe um dia encontre um baralho incompleto, onde caiba ainda um Ás de Copas perdido. E se os senhores um dia encontrarem uma cigana vestida de verde, dos olhos doces e da pele suave, peço-lhes que lhe digam que sinto falta do aconchego de seu bolso, do toque de suas mãos e do carinho que ela sabia me fazer sentir. Digam a esta mulher, que procuro ainda a resposta certa e os motivos certos de um adeus tão frio e amargo. Agora sou apenas um Ás de Copas vagando fora do baralho.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Um piano. Uma voz.

Sentada sobre o piano, ela cruzou as pernas e tragou o cigarro. As luzes do palco voltavam-se à ela. O pianista manobrava as notas no instrumento enquanto o jeito dela, displicente, seduzia o pequeno público diante de seus olhos. Uma das mãos ainda apoiava o seu peso sobre si mesma. Estava bêbada outra vez, mas sua voz enganava. Ela ainda canta como há muito tempo atrás. Agora cantava com a alma, com a dor que trazia e arranhava sua carne por dentro. Queria gritar alto e expulsar os demônios que atormentavam sua mente, mas eles voltariam. Só o que lhe restava era entoar a canção para que os fizessem adormecer por alguns instantes.

dispense o título.

O vinho tinto derramado no tapete trazia o cheiro da noite deprimente. Rosto cansado. Boca manchada de batom. Maquiagem borrada. O preto ainda delineava os olhos azuis.
Deitada no sofá da sala fitava o teto em profunda concentração, enquanto as cortinas da janela dançavam com o vento. Pílulas em cima da mesa e uma madrugada em branco lhe faziam companhia. Lágrimas escorriam por sua face suja de olheiras. Vestia seu vestido mais novo da cor de suas unhas pintadas de esmalte rubi. A sandália do salto alto encolhia-se em um canto qualquer. Seu corpo ainda exalava o perfume francês. Já havia se acomodado dentro de sua bolha não tão transparente.
Pensou que poderia ter se libertado, porém, arrependimento e escrúpulos eram só o que ainda restava em sua consciência. Que mais poderia sentir além da culpa e da pena de si mesma?
Sabia que a porta não estava trancada. Alguém havia partido há algumas horas atrás. Partido pra não mais voltar.
Já era quase de manhã. Enfim fechou os olhos. Tudo continuou no lugar. Tudo como ontem à noite. Tudo como deveria continuar.